segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

A DISLEXIA e o ENSINO da LECTOESCRITA

A dislexia e o ensino da lectoescrita

Cumpre-nos, agora, provocar algumas reflexões pertinentes a este momento muito especial de início de século. Qual o papel do professores, pedagogos, psicopedagogos, lingüistas, psicolingüistas no ensino da leitura, na perspectiva de trabalho com os bons e maus leitores?
Surge, agora, no meio universitário, uma atmosfera acadêmica de especulações sobre a atuação dos de magistério no novo milênio. Assim, gostaria de, nesse clima, especular um pouco sobre a atuação dos profissionais de Letras na sociedade pós-industrial.
De logo, levanto algumas questões fundamentos para nossa reflexão: teremos nós, educadores e letrados, espaço profissional na sociedade informática? O ensino de línguas sobreviverá ao desenvolvimento tecnológico persistindo o modelo trabalhado hoje em nossas salas de aula? E como fica a situação dos professores da rede pública de ensino, enquanto servidores estaduais, portanto, participante da estrutura do poder público, na nova organização do capitalismo pós-industrial?
Para responder a estas questões, permitam-me que me aproprie de três referências teóricas para esta reflexão, a saber: Capitalismo desorganizado, de Claus Offe (Brasiliense), A sociedade de informática, de Adam Schaff (Brasiliense) e O Culto da Informação, de Theodore Roszak (Brasiliense).
Com certeza, na sociedade informática, nós, profissionais de Letras, não vamos desaparecer enquanto especialistas do ensino de línguas materna e estrangeira. Perderemos, sim, a natureza do nosso trabalho que vai transcender os limites escolares e chegará ao novo mercado de trabalho, isto é, o mercado de serviços. Claus Offe diz que nesse processo passaremos a participar de uma espécie de "classe de serviços".
É possível, porém, que haja uma perda de identidade histórica de "professor" e com ela todas as prerrogativas inerentes à tradição do magistério (aposentadoria especial, por exemplo) e passaremos a ser instrutores de português, inglês, etc. atendendo a uma clientela muito variada que vai da formação de um profissional de instrução de escolar ao guia de turismo.
No que toca ao mercado de trabalho, o que eqüivale a dizer espaço de atuação profissional de Letras, no século XXI, as expectativas são otimistas, melhor dizendo, são predominantemente otimistas, pelas seguintes razões:
A sociedade informática carecerá cada vez mais de instrutores (ou professores) de símbolos e signos lingüísticos e que lidem com pessoas na perspectiva de atenuar o trabalho individual, pesado, da produção de material; será intensificada o treinamento das habilidades associadas à Escrita e à Leitura (lamentavelmente, em detrimento da Fala e da Escuta, duas habilidades fundamentais na comunicação social) e os profissionais de Letras atuarão na formação de trabalho (na área de turismo, em particular, uma vez que na sociedade informática as pessoas terão mais tempo para o lazer) resultante da política social provocada pelo Estado de Bem-Estar Social que vai procurar evitar a crise do desempenho estrutural. Em resumo, ganharemos muito com a chamada expansão do setor de serviços.
A demanda por serviços na área de Letras continuará a crescer como, por exemplo, o de retreinamento ocupacional através de cursos por correspondência de leitura e escrita e cursos de línguas. É uma realidade que, nós, professores e alunos, já no início deste século, já nos comuniquemos mais intensamente em nossas próprias casas através de nossas webmails.
É possível imaginarmos ainda a seguinte situação virtual para o futuro dos letrados, já com indícios de práxis bastante reais nos nossos dias: o professor de Português, em particular de Redação escrita, não só dando notas aos alunos eletronicamente mas também se comunicando com eles a qualquer hora do dia ou da noite e, talvez, observando, via on-line, se um texto está sendo bem estruturado, obedecendo uma planilha previamente negociada entre professor e aluno e processado tudo na tela do vídeo, fazendo sugestões que possam auxiliar à distância.
A escrita, na perspectiva de um Theodore Roszak, exigirá a intervenção docente uma vez que qualquer tentativa randômica, isto é, de produção textual aleatória, comunicará palavras, informações, menos idéias e significados que levem em conta as intenções do emissor. E nós, sabemos que, por trás de um texto bem escrito, exige muito suor, muito ziguezague, ida e volta e um olhar, uma leitura preliminar do professor e seu jeito de acompanhar o sucesso ou o insucesso do aluno tem muito a ver com a aprendizagem.
O ensino de línguas, da escrita, em particular, exige da escola do futuro o professor nos moldes modernos de hoje: observador, leitor das intenções dos alunos e seu maior interlocutor. Enfim: a escrita e a leitura são duas habilidades escolares que trazem consigo uma espontaneidade biológica, dependem de um fluxo natural, numa palavra: dependem do diálogo humano livre. Se analisarmos o contexto da sociedade informática sob a ótica capitalista, ou melhor, dos fabricantes dos computadores, a situação do ensino da Escrita e da Leitura, no século XXI, será avassaladora: os computadores farão tudo, inclusive ajudar na produção significativa de um texto escolar. No entanto, há nessa especulação mais folclore do que verdade.
De qualquer maneira, sua propaganda no meio escolar poderá trazer conseqüências funestas, entre as quais a de fazer que um profissional, por exemplo, letrado, creia que a escrita pode ser realmente, uma questão de processamento de informação e não de idéias e mais uma vez reafirmo: um texto vai além de informações.
A sintaxe de um texto não é apenas uma relação sintagmática de, substantivos e adjetivos, verbos e sujeitos, mecânica; daí, dificilmente os computadores esgotarem, no futuro, todas as possibilidades de relações de interdependência da frase (concordância, regência e colocação) porque mais do que coerência de regras ou de imposição de normas ou coerções gramaticais há intenção, estilo, de natureza imaginativa, criativa, subjetiva e que surpreende todas as determinações da realidade objetiva ou descritiva.
Para não demorar mais sobre essas especulações, diria que está claro que, no Século XXI, profissionais que hoje estão se formando em Filosofia, História e Letras terão grande espaço no mercado de trabalho.
Seremos nós, que dentro ou fora da escola, auxiliaremos as pessoas a perguntarem sobre as suas perspectivas de vida e nós, de Letras, seremos ainda mais significativos, porque todas as profissões do futuro são baseadas no literacy (capacidade de ler e escrever).
Por fim, diria que somente com a lectoescrita, isto é, com as habilidades de leitura e escrita, as pessoas serão capazes de superar as dificuldades de aprendizagem relacionadas à linguagem (dislexia, disgrafia e disortografia), de acessar os livros, as idéias dos livros contidas ou não nos computadores, insights éticos e visão social do mundo que a lógica da inteligência artificial não conseguirá decifrar a partir de um rubor, de uma piscadela ou de um gaguejar que revelem a natureza do problema do estudante e sejam ponto de partida para o magistério do professor-aluno.

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