DISLEXIA(S) NO ENSINO SUPERIOR
A multiplicidade de concepções teóricas, bem como a diversidade etiológica dificulta-nos a apresentação de uma delimitação clara e consensual.
De acordo com a Associação Internacional de Dislexia (2002):
A Dislexia é uma dificuldade específica de aprendizagem de base neurológica. É caracterizada pelas dificuldades no correto e/ou fluente reconhecimento de palavras e pelas pobres capacidades de descodificação e problemas na ortografia. Estas dificuldades resultam tipicamente de um déficit no componente fonológico da linguagem que é frequentemente inesperado em relação a outras competências cognitivas e ambiente escolar favorável. Consequências secundárias podem incluir problemas na compreensão da leitura e reduzida experiência de leitura que impedem o enriquecimento vocabular e o enriquecimento do conhecimento.
A Federação Mundial de Neurologia define a Dislexia como "uma desordem manifestada pela dificuldade de aprender a ler apesar de instrução convencional, adequada inteligência e oportunidades sócio-culturais" (Critchley, 1975, citado por Richardson & Wydell, 2003). Mais recentemente, e de acordo com Galaburda (Richardson & Wydell, 2003) é geralmente aceita que a Dislexia seja perspectivada como uma condição neurológica complexa, ainda que se registre alguma falta de consenso sobre os déficits funcionais subjacentes a esta condição. No âmbito da definição do construtor em análise, alguns autores verificaram que o termo Dislexia "tem sido muitas vezes evitado em virtude do risco de desigualdade de distribuição dos limitados recursos públicos" (Reason et. al. 1999, citado por Richardson & Wydell, 2003, p.476). Consequentemente, em muitos países, educadores e profissionais têm preferido falar em "dificuldades específicas de aprendizagem".
Se no ensino básico e secundário são os problemas ortográficos dos disléxicos os indicadores de alerta para a intervenção (Pereira, 1990), no ES a sinalização e identificação dos casos dependerá essencialmente dos relatos dos próprios estudantes (McGuire et. al., 1996; National Working Party on Dyslexia in Higher Education, 1999, citados por Richardson & Wydell, 2003). Esta especificidade poderá levar-nos a pensar que muito provavelmente desconhecemos o verdadeiro impacto da Dislexia no ES, uma vez que ainda existem variados mitos relativamente à sinalização e intervenção em alunos com NEE neste nível de ensino. A este respeito, e seguindo a realidade de outros sistemas educativos, reconhecemos a importância do movimento da escola inclusiva também no ES, no sentido de permitir percursos diferenciados, potenciando, desta forma, o sucesso acadêmico e bem-estar pessoal e social. A título de exemplo, referimos a realidade do Reino Unido na qual se tem operado uma mudança nos últimos 40 anos de um ES que "passou de um sistema relativamente elitista para um sistema educativo inclusivo, passando a englobar cerca de 50% de jovens" (Richardson & Wydell, 2003, p.476).
Neste âmbito, importa referir o Relatório do National Working Party on Dyslexia in Higher Education (NWPDHE), datado de 1999, que pretendeu aprofundar o impacto da Dislexia em adultos que frequentam o ES. Para além de apresentar sugestões de melhoria nas políticas, no suporte e nas práticas neste nível de ensino, o referido documento também revelou dados sobre o atendimento prestado a estudantes com Dislexia. Das 234 instituições analisadas peIo NWPDHE verificou-se que a prevalência de Dislexia era de 1,35% (cerca de 23 mil estudantes) e que 43% destes estudantes apenas foram identificados como disléxicos apenas após o ingresso no ES (Richardson & Wydell, 2003).
A prevalência de Dislexia é, normalmente, cinco vezes superior em indivíduos do sexo masculino quando comparados com o sexo feminino (Halpern, 1992; National Working Party, 1999, citados por Richardson & Wydell, 2003). Contudo, no ES, não se registra esta tendência de forma tão acentuada. De acordo com a hipótese levantada peIo "Working Party", as mulheres com Dislexia apresentam uma maior probabilidade de entrar no ES comparativamente com o sexo oposto (Richardson & WydeU, 2003). Considerando os resultados obtidos na mesma investigação, os estudantes com Dislexia escolheriam mais provavelmente cursos em áreas como agricultura, artes e design, engenharias, arquitetura, ciências físicas, biológicas e sociais e ciências informáticas, comparativamente com estudantes sem dificuldades neste domínio que optariam mais por cursos como medicina veterinária, medicina ou outros cursos relacionados, línguas e literatura, direito e educação.
Em Portugal, a investigação nesta área começa a dar os primeiros passos, existindo um levantamento de dados a nível nacional, desenvolvido pelo Grupo de Trabalho de Apoio ao Estudante Deficiente no Ensino Superior (GTAEDES), o qual nos permite verificar que existem 816 estudantes com NEE no ES, sendo que 73 são disléxicos. Destes, 24% escolheram um curso na área das Tecnologias; 19% na área da Arquitetura, Artes Plásticas e Design; 19% cursos relacionados com o Direito, as Ciências Sociais e Serviços; 17% relacionados com a Economia, a Gestão e Contabilidade; 9% na área das Ciências e apenas 3% optaram por cursos relacionados com a Saúde (Pires, 2009).
Apesar da dificuldade em aceitar e/ou declarar o diagnóstico de Dislexia por parte dos estudantes do ES, até o momento, encontram-se em acompanhamento pelo SAPE oito estudantes que, por iniciativa própria ou após encaminhamento de docentes, procuraram o Serviço por revelarem dificuldades ao nível da leitura e da escrita. Alguns destes estudantes procuraram a avaliação na tentativa de compreensão das suas dificuldades, outros procuraram o serviço para continuarem a desenvolver as estratégias de intervenção já iniciadas no seu percurso escolar anterior. Acreditamos que exista um maior número de casos, não só no âmbito de todas as escolas do IPL , como sobretudo a nível nacional, alertando-nos assim para a necessidade de refletirmos sobre a avaliação e intervenção em estudantes com NEE no ES, especificamente no domínio da Dislexia.
Fonte: Dislexia no Ensino Superior: contributos do Serviço de Apoio ao Estudante e do Centro de Recursos para a Inclusão Digital do Instituto Politécnico de Leiria
terça-feira, 13 de outubro de 2009
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