QUANDO É DIFÍCIL APRENDER
O que acontece com alunos que aparentemente fazem tudo como manda o figurino, mas não atingem bons resultados
A mãe é convocada pelo colégio e descobre que o aluno, seu filho, não está acompanhando a classe. Ela se defende. O menino faz as lições, é esforçado e nunca reclama de nada. Então vem o golpe duro: o professor alerta que, se continuar desse jeito, ele repetirá a série. Neste ponto, o momento que a coordenação pedagógica informa que o estudante tem dificuldades de aprendizagem, uma batalha informal é estabelecida. De um lado, a mãe, abalada, desconfia que, se o filho chegou a esse ponto, é porque a escola não ajudou. Admitir qualquer limitação do filho é algo obviamente difícil para uma mãe. Do outro, os professores defendem o colégio e os métodos usados. No meio do bombardeio, o aluno, com a auto-estima abalada e, não raro, um discurso de menosprezo às matérias como tentativa de consolo.
Dificuldades de aprendizado afetam dois em cada dez estudantes, atestam as pesquisas internacionais. Mas os educadores alertam: são raríssimos, residuais os casos de alunos dedicados, e sem nenhum problema familiar, físico, de saúde, psicológico ou pessoal, que se esforçam e mesmo assim não aprendem nada. Em outras palavras: o ser humano limitado pela natureza, que o povo chamaria de burro, e praticamente um mito. Na quase totalidade dos casos, há algum problema que pais e professores não identificam. Eles podem ir de uma crise doméstica - a separação dos pais, por exemplo - a um trauma que provocou insegurança, passando por falta de organização, excesso de cobranças e de atividades, métodos de ensino inadequados e até a conhecida preguiça. Para a coordenadora do curso de pedagogia da Universidade de Campinas (Unicamp), Ângela Soligo, existem momentos críticos para o surgimento das dificuldades: Entre os pequenos, elas se manifestam na alfabetização e nos primeiros contatos com a matemática. "A criança pode lidar com letras e números desde cedo, mas o processo de ensino é uma novidade", diz. Caso o filho não consiga seguir o método, pode oferecer resistência às aulas. Outra possível consequência é o sentimento de inferioridade. Normalmente, as escolas ressaltam as crianças bem-sucedidas. Há o risco de algumas acharem que são incapazes, levando essa sensação para a frente.
Outro momento em que surgem os obstáculos é a quinta série do ensino fundamental. É um período de mudanças, quando o aluno deixa de ter um único professor e passa a contar com vários mestres. A sétima série também pode exigir mais do estudante, agora envolvido com questões típicas da adolescência. Um olhar mais atento pode evitar complicações maiores - desde que os pais não cobrem demais dos filhos. "Alguns chegam destruídos ao consultório. Tem mãe que entra com o diagnóstico pronto: ele é um vagabundo", conta a neuropsicóloga Ana Olmos, especializada em crianças e adolescentes. Às vezes, o estudante não quer mesmo saber da escola - por considerá-la chata ou sentir que nunca é ouvido. Mas existem casos em que o jovem tenta aprender e não consegue. "Se ele passa o dia sem ânimo para nada, pode estar com depressão", observa Ana.
O diagnóstico correto é essencial. O processo começa com a investigação da saúde. A família Fanucchi demorou para descobrir que Bruno, 12 anos, sofria de dislexia, um distúrbio que provoca alterações neurológicas. "Sempre passei raspando em inglês. Estudava e ia mal", recorda-se ele. A mãe, Silvia, recebia reclamação desde que o filho era pequeno. "Achavam que era problema de atenção. Ele fez aulas particulares. Até que detectaram a dislexia", afirma. Com o acompanhamento certo, o menino passou sem recuperação. Em geral, as famílias partem logo para a aula particular. "Sem investigar direito a causa, a aula particular vira muleta e o problema se arrasta", afirma a psicopedagoga Raquel Caruso, que atende alunos com distúrbios de aprendizagem.
A solução deve ser negociada entre família, estudante e escola. É importante ponderar se o colégio e sua metodologia estão adequados ao filho. Outro ponto a considerar é se a instituição está preparada para lidar com a diversidade. O educador espanhol Álvaro Marchesi, autor de o que será de nós, os maus alunos?, argumenta que as dificuldades serão maiores no futuro. "O incremento da imigração e as mudanças na família vão levar a multiplicação da diversidade", afirma ele. Mas o preparo para essa realidade não é comum. Na opinião de Silvia Colello, professora de psicologia da educação da USP, as escolas tradicionalmente orientam suas atividades pressupondo uma certa homogeneidade das turmas. O professor ensina o mesmo conteúdo, do mesmo modo, prevendo um único caminho de evolução. Silvia recomenda que colégios e educadores repensem suas responsabilidades. "É preciso derrubar alguns mitos", sustenta. Pelo bem de todos.
COMO AJUDAR
Uma avaliação médica apontará problemas como os de visão e audição. Eles atrapalham o aprendizado.
Procure os outros pais e descubra se há muitos casos de alunos com dificuldades na mesma matéria. Se houver, converse com o professor a respeito da metodologia.
Crises familiares podem estar associadas às dificuldades escolares. É recomendável a psicoterapia.
Use atividades do cotidiano para treinar os pontos fracos, como conferir o troco das compras com a criança. E incentive os fortes. Isso melhora a confiança e a auto-estima.
Não compare a performance ao filho com a dos demais estudantes. Cada um tem seu tempo e seu jeito de aprender.
Barreiras são superadas com ações que envolvem os pais, o colégio, o aluno. Assuma sua parte sem entrar em desespero e cobre a do filho sem esquecer que ele precisa também de afeto, além do apoio em casa.
sábado, 20 de março de 2010
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